A auxiliar de farmácia Valdira de Melo Vilela, de
36 anos, pronunciada em julho deste ano por ter atropelado e matado um homem
enquanto dirigia embriagada pela rodovia Washington Luís, pode não ir mais à
júri popular.
O desembargador Alexandre Almeida acatou o pedido da
defesa e determinou a desclassificação do crime doloso contra a vida. Para convencer
o Tribunal de Justiça, o advogado criminalista Antônio José Giannini argumentou
que não há provas suficientes de que sua cliente agiu com intenção de matar, e apostou
na subjetividade da reação à ingestão de bebida alcoólica.
“Eu posso beber a mesma quantidade de álcool que
você e sofrer impacto diferente. Cada pessoa tem uma resistência ao álcool.
Você pode beber muito e manter suas faculdades mentais inalteráveis ou beber
pouco e perder a razão”.
Outro elemento utilizado pela defesa foi o
testemunho de uma amiga de Valdira, que pegou carona com a motorista após uma
confraternização.
“Ela disse que foi deixada em casa pela Valdira, e
que no trajeto a motorista dirigiu com total lucidez, sem cometer infrações de
trânsito. O atropelamento foi uma fatalidade”, argumentou Giannini.
Em segunda instância, o advogado pediu a desclassificação
do homicídio duplamente qualificado – por meio que possa resultar perigo comum
e mediante surpresa - previsto no Código
Penal, para homicídio culposo na direção
de veículo automotor, previsto no artigo 302 da lei 9503/97, cuja pena é mais
branda.
O relator do recurso, Alexandre
Almeida, analisou o documento e respondeu que mesmo estando comprovada a
ingestão de bebida alcoólica através de teste do bafômetro e exame de sangue,
não se vislumbra comprovado o dolo. Ou seja, que assumiu o risco de produzir a
morte quando dirigiu o automóvel nas condições em que estava.
“Acontece que a doutrina
reconhece que o dolo eventual existe desde que o réu, prevendo o resultado, não
desista da conduta, aceitando de forma indiferente que o desfecho possa
ocorrer; enquanto que na culpa consciente, que mais se adéqua à espécie, embora
o resultado possa ser previsível, o agente confia que ele não ocorrerá. Tanto é
assim, que já decidiu o Supremo Tribunal Federal que o simples fato de o réu
estar embriagado e na direção de veículo automotor é insuficiente, por si só,
para caracterização do dolo”, escreveu, anexando à resposta casos semelhantes
que tiveram o mesmo entendimento.
Para o desembargador, as provas
do processo não indicam que a acusada tivesse ingerido bebida alcoólica com
intenção de dirigir e causar o acidente, mas que agiu de forma imprudente,
negligente ou imperita, dando causa ao resultado fatal.
“Em suma, mal comprovado o dolo
eventual imputado à recorrente na denúncia e na decisão de pronúncia, o recurso
merece acolhimento, para que, nos termos do art. 419, do Código de Processo
Penal, seja desclassificada a conduta”.
O julgamento teve participação
dos desembargadores Guilherme Strenger, Xavier de Souza e Salles Abreu.
Com a desclassificação, Valdira será julgada pela Justiça comum, e não mais em Júri Popular.
Ao Tribunal do Júri cabe apenas o julgamento de crimes dolosos contra a vida.
O Ministério Público pode
recorrer da decisão.
Entenda o caso
No dia 15 de janeiro do ano
passado, por volta das 4h15, Valdira dirigia um Pálio pela rodovia Washington
Luís quando atropelou o guincheiro Everton Sílvio Marquetto, de 39 anos. A
vítima, que estava em cima do caminhão quando foi atingida, morreu na hora.
Valdira reconheceu que havia
ingerido bebida alcoólica e afirmou que se assustou com a luz de um farol, que
achou que era de uma moto que trafegava na pista, e acabou colidindo com o
caminhão. Peritos constataram que ela dirigia em alta velocidade.