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Sexta-Feira, 21 de Fevereiro de 2020 às 12:08

Advogada fotografa plenário, jurados ficam com medo e Júri Popular é cancelado

Juíza Gláucia Véspoli classificou como "irresponsável" a atitude da advogada, que provocou prejuízos para Justiça. Foto: arquivo

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Uma situação inusitada obrigou a juíza da 5ª Vara Criminal, Gláucia Véspoli Oliveira, a cancelar o Júri Popular que acontecia nesta quinta-feira, 20, no Fórum Central de Rio Preto . Uma advogada que assistia ao julgamento utilizou o celular para fotografar, com flash, o plenário. Atitude que é expressamente proibida em cartaz na porta da sala e reforçada pelos assistentes judiciários junto ao público presente. A exceção fica apenas para os veículos de imprensa devidamente identificados, com a recomendação de que não filmem/fotografem os jurados.

A ação foi percebida pelo promotor de Justiça, Marco Antônio Lélis Moreira, que pediu pausa no andamento do Júri para que um funcionário do Fórum vistoriasse o celular da advogada. No aparelho havia duas fotografias, do promotor e dos advogados, e a mulher foi orientada a apagar as imagens.

O Júri Popular definiria a sentença de dois homens acusados de homicídio triplamente qualificado e suspeitos de envolvimento com a facção Primeiro Comando da Capital. Um deles, Leandro Baria, estaria jurado de morte e por esse motivo é mantido isolado na penitenciária de Andradina que, segundo pessoas ouvidas pela reportagem, é considerada unidade prisional “neutra”, ou seja, sem o domínio da organização criminosa.

Quando a advogada fotografou o plenário, uma testemunha e os dois réus já tinham sido ouvidos, faltava apenas a segunda parte do julgamento, que é o embate entre Ministério Público, responsável pela acusação, e a defesa, constituída por 10 advogados.

A juíza Gláucia Véspoli determinou o intervalo para o almoço e, no retorno, cinco dos sete jurados que compõem o Conselho de Sentença manifestaram constrangimento e temor em relação à foto tirada pela advogada, afirmando que também foram fotografados por ela. Neste momento a advogada já não estava mais em plenário e não foi possível verificar se havia outras fotos, especialmente dos jurados, no aparelho celular. Com o conselho temeroso pelas consequências em decidir se os réus são culpados ou inocentes, justamente pela suspeita de envolvimento deles com o PCC, a magistrada encerrou o julgamento, que foi remarcado para o dia 16 de abril.

No termo de audiência, já disponível no site do Tribunal de Justiça, a juíza Gláucia classifica como irresponsável a atitude da advogada, “ciente da proibição de uso de telefone celular ou de registro fotográfico de sessões do Júri, tanto por profissão quanto pelo aviso expresso ostentado à porta do plenário, com prejuízo do trabalho de todos, tempo dos senhores Jurados, e dos colegas de profissão, inclusive alguns vindos da capital com todo o custo financeiro que acarreta”.

Procurado por telefone, o promotor Marco Antônio Lélis lamentou o episódio que, na opinião dele, provocou prejuízos para o julgamento, já que um dos réus assumiu o crime durante o depoimento e descreveu com detalhes a participação dele e do comparsa, situação que pode não se repetir na próxima sessão.

“Há muita estrutura empenhada para que um Júri Popular aconteça. Transporte dos presos, disponibilidade dos jurados- porque são todos trabalhadores- estudo das teses de acusação e defesa, advogados que vieram de São Paulo. Foi realmente uma infelicidade da advogada”, comentou.

A juíza também solicitou que a Ordem dos Advogados do Brasil, subseção de Rio Preto, seja oficiada sobre o fato e tome providências cabíveis com relação à advogada.

Em nota, o advogado Rogério Bereta, coordenador da Comissão de Ética da OAB, afirmou que “o processo disciplinar tem como regra ser sigiloso. Portanto, mesmo quando os fatos são de conhecimento público, na hipótese da advogada vir responder a processo disciplinar, sequer pode ocorrer qualquer divulgação de informação dessa eventual instauração de procedimento”.

A advogada que fotografou o julgamento ainda não foi localizada para comentar o assunto.

 

O crime

Segundo informações do processo, na madrugada do dia 17 de setembro de 2014, Leandro Aparecido Baria, conhecido como Monicão, Vitor Gabriel Liberato, o “Vitinho” e mais um adolescente, asfixiaram Samuel Carlos Rodrigues, vulgo “Samuca”, causando a sua morte. Conforme se apurou, os denunciados, o adolescente e a vítima estavam envolvidos com o tráfico de drogas no município de Uchoa. A vítima possuía uma dívida de drogas de R$100,00 com Leandro, o qual resolveu matá-la e, para tanto, solicitou o auxílio de Vitor e do adolescente. Com o intuito de ludibriar a vítima, o adolescente e Vitor convidaram Samuel para fumar um “baseado” e “fazer uma fita” juntamente com Leandro. Os três buscaram a vítima em veículo Escort, de propriedade do Vitor. Leandro e o adolescente sentaram no banco de trás, instante em que a vítima Samuel sentou-se no banco da frente, ao lado do motorista. Na sequência, induzida pelos agentes, a vítima consumiu droga e quando ainda estava sob seus efeitos, o adolescente pegou uma corda, fez um laço, passou pelo pescoço de Samuel e começou a puxar, momento em que ele passou a implorar pela vida. A vítima ainda estava viva quando Leandro a tirou do carro, amarrou a corda que estava no pescoço da vítima na parte traseira do veículo e passaram a arrastar Samuel pela estrada de terra que liga Uchôa à Cedral. Após algum tempo arrastando a vítima, os três saíram do carro e, fazendo uso de um alicate, arrancaram os dentes da frente de Samuel. Em seguida, abandonaram o corpo na beira da estrada e fugiram.

Pelo crime, Leandro e Vitor foram denunciados por homicídio triplamente qualificado: por motivo torpe, tortura e recurso que impediu a defesa da vítima.

Em OFF

Um advogado que não quis ser identificado disse que, após o crime, Vitor foi julgado por um “tribunal do crime” e absolvido, porque alegou ter sido chamado apenas para agredir Samuel e não foi responsável pela morte da vítima.

Já Leandro teria sido jurado de morte pela facção porque ignorou a autoridade dos líderes e executou Samuel sem pedir autorização. 

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